26 de fevereiro de 2011

Dois anos de Chile

Hoje, 26 de fevereiro de 2011, faz exatamente dois anos desde que cheguei ao Chile.

Lembro-me perfeitamente desse dia. Era quinta-feira, depois do carnaval. Minha mãe já havia vindo no dia anterior, ela ia me buscar no aeroporto e passar a primeira semana aqui comigo.
Despedir-me do Rio foi difícil. Mas as semanas anteriores haviam sido tão corridas, com apresentação de monografia e carnaval, que a ficha só caiu mesmo na hora de partir. O último abraço nas pessoas queridas e a entrada na sala de embarque do aeroporto foram com o rosto coberto de lágrimas. A passagem pelo controle de passaporte, raio X e a entrada no avião foram como um borrão.

Depois que o avião decolou, li algumas cartinhas, da minha irmã e amigas. As lágrimas corriam soltas e só pararam quando, finalmente, a exaustão me levou a dormir.
De repente, eu já estava chegando. O comandante anunciou que íamos cruzar a Cordilheira dos Andes e aterrissar em Santiago. Nessa hora as lágrimas já haviam secado e a saudade foi jogada para um canto do coração. Veio a expectativa. Estava chegando na minha nova cidade, no meu novo país. No lugar que ia ser a minha casa por pelo menos dois anos.
A minha mãe estava lá me esperando. E isso fez toda a diferença. Se eu tivesse que ter me despedido dela no Rio, junto com os outros, talvez não tivesse força para continuar. Até aquele momento, não conseguia conceber a idéia de "casa" sem a mamãe.

Era noite quando eu cheguei à Santiago. Não pude ver muito da cidade e fomos direto a um hotel pertinho do Palácio La Moneda. Ao chegar no quarto e ligar o rádio, a primeira música que tocou foi "Eu sei que vou te amar". Simbólica coincidência.

A primeira semana passou bem rápido. Conheci muito de Santiago, me mudei para uma residência estudantil, comecei o mestrado, conheci muita gente nova. E finalmente me despedi da minha mãe. Era hora de começar a andar com as minhas próprias pernas.

E o tempo foi passando. Aprendi a cozinhar, a pagar as minhas contas, a cuidar de mim mesma quando fiquei doente… Encarei as aulas faladas em espanhol e as diferenças marcantes no ambiente acadêmico. Me mudei para um apartamento, dividindo-o com duas meninas que tinha acabado de conhecer. Vi o primeiro inverno chegar e a Cordilheira ficar branquinha, cheia de neve…
Terminei o primeiro semestre de mestrado e me despedi de pessoas que em tão pouco tempo tinham se tornado muito especiais. Um duro golpe.

Fui algumas vezes ao Rio e recebi algumas visitas aqui. O carinho pelas pessoas que estão longe só aumentou. Sem a sua presença é que verdadeiramente percebemos o quanto elas significam.

Tive momentos de profunda solidão. Conheci a frustração de metas não cumpridas e chorei muitas e muitas vezes. Amadureci. Percebi que quando estamos longe de nosso país, vamos ser sempre estrangeiros e senti o verdadeiro sentimento de pátria.

Por outro lado, fui me acostumando de mansinho com a minha nova vida. Santiago, de repente, virou casa. Ganhou um espaço no meu coração. Aprendi a apreciar e respeitar o Chile, com seus prós e contras, como todos os países. Conheci lugares lindos e paisagens de tirar o fôlego. E falar espanhol se tornou algo natural.

E aí completei um ano de Chile… Como o tempo passou rápido!
Já nas primeiras horas do meu segundo ano aqui, vivi um terremoto de 8.8 graus na escala Richter. Uma experiência que me marcou para sempre, mas que também propiciou mudanças inesperadas.

"Levantei, sacudi a poeira e dei a volta por cima." Mudei de apartamento e conheci muita gente nova, inclusive o homem que hoje é o meu companheiro. Com ele, mudei novamente de apartamento e começamos a gostosa aventura de viver juntos. Conheci mais do Chile, seu povo e sua cultura, e comecei a sentir-me muito mais integrada ao país.

Fiz menos visitas ao Brasil, mas recebi mais visitas aqui. Sofri novamente com a saudade. Passei pelo meu segundo inverno e até aprendi a praticar um pouco de snowboard. Criei esse blog, que se tornou uma terapia para mim. E, profissionalmente, passei muitas crises, e pensei várias vezes em jogar tudo para o alto.
Mas agüentei firme. Fiz novos planos e decidi ficar aqui para o doutorado, por pelo menos mais quatro anos. E estou cada dia mais perto de me tornar mestre em astrofísica.

E agora comemoro dois anos de Chile. Agradeço a todas as pessoas que, de perto ou de longe, contribuíram para o meu bem estar aqui. E que o terceiro ano seja ainda melhor! :)

Meu primeiro dia em Santiago de Chile, há dois anos atrás

3 comentários:

  1. Eu posso imaginar essa sua sensação de estrangeira. Eu só passei duas semanas aí, e todos foram mais do que legais e prestativos (inclusive você :) ). A estadia foi maravilhosa, e mesmo assim quando a gente tava sobrevoando o Rio eu abracei a poltrona da frente do avião e falei: Estamos em casa!!!!

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  2. Prezada Lara:
    Estava navegando por alguns links sobre “Sociedades de Astronomia” e encontrei o seu blog. Achei muito bacana você estar aí no Chile há mais de dois anos, perseguindo o ideal de fazer um mestrado e doutorado em Astrofísica. Gostei da maneira espontânea como você escreve, falando da saudade do seu Rio de Janeiro (bela foto que você postou!), e também da sua adaptação aí no Chile. Estive aí em 1980, em lua-de-mel, e achei o povo muito hospitaleiro, principalmente com brasileiros. Gostei também da sua receita do bolo de cenoura com chocolate, que sempre foi um dos meus preferidos. Moro no Rio, sou engenheiro mecânico da Petrobras, e astrônomo amador nas horas vagas. Cheguei a ter bolsa do CNPq no Observatório Nacional, por três anos, sob supervisão do Ronaldo Mourão, na época em que o Prof. Muniz Barreto era o diretor de lá. Fui também amigo do Marcomede Nunes, físico do O.N. recentemente falecido. No ano passado encomendei um telescópio Schmidt-Cassegrain de 180 mm de abertura a um construtor de SP e agora estou terminando de construir o seu suporte. Estou super-ansioso para estrear este novo “brinquedo”, e poder fazer melhores observações, junto com o Sérgio (filho). Desejo-lhe muito sucesso, pretendo continuar visitando o seu blog. Um abraço, Ronaldo Câmara.

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  3. Oi Ronaldo,
    obrigada pela sua simpática mensagem e seja bem vindo ao blog! :)
    Eu freqüentei bastante o ON e o MAST e tenho um grande carinho pelo Observatório. Além de ter feito iniciação científica lá por 3 anos e meio, a minha mãe trabalhou no Museu de Astronomia quando eu era criança e há vários anos trabalha no ON. Através dela tive a oportunidade de conhecer o Marcomede e, ainda na época do MAST, cheguei a ir num coquetel de homenagem ao Muniz, com sua ilustre presença.
    Parabéns pela aquisição do telescópio! Te desejo ótimas observações com o seu filho! As horas que passei no MAST na minha infância, perambulando pelas exposições e telescópios, foram determinantes na escolha da minha profissão. A astronomia é mesmo apaixonante! :)

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